505 (Extended Version): Track 1 - Side A



Eu estava encolhida no canto do elevador. Doida para chegar a casa. Encolhi cada milímetro do meu corpo, abraçando a mim mesma, apertando firmes os braços. Precisava me sentir segura de alguma forma, me sentir humana. Eu não sabia o que pensar. Só queria que o elevador chegasse logo.
Estava fungando, respirando pesado e minha posição fazia com que minhas lágrimas molhassem não só o meu rosto, ma meu cabelo e minhas roupas. Eu me senti como uma pobre coitada e fiquei péssima por isso.
Eu soluçava e sentia que a dor era mais do que emocional. O meu físico doía tanto quanto qualquer outra coisa. Respirei fundo novamente.
Havia mais alguém no elevador comigo, percebi que ele me olhava fixamente com uma mistura de preocupação com pena. Percebi que ele mantinha os olhos analisando cada pequeno espasmo que meu corpo dava, apesar de tudo aquele fato, o do homem estar me observando, eu não me importava. Eu via a sombra negra e turva ao meu lado, sentia um forte cheiro de cigarros, mas não cedia de jeito nenhum, não ousava olhar pra ver quem era, ou o que era. Pouco me importava. Para mim só existiam duas coisas: Eu e a dor. Não queria me mover, só me martirizar por ser incapaz.
Era exatamente assim que eu me sentia. Incapaz. Incapaz de manter um relacionamento, incapaz de ser feliz com isso. Não conseguia ser como as minhas colegas de faculdade que namoravam os mesmos caras desde o ensino médio.
Eu queria aquela impressão de que o amor iria durar para sempre, mas não aquela coisa que se sente nos primeiros meses. Queria essa sensação por dois, três, dez anos! Queria um casamento, filhos e casa cheia nos fins de semana; Queria uma cópia de como minha vida era quando eu era criança aos 30 anos. Queria ser feliz, eu aspirava o amor por algum motivo.
A porta do elevador se abriu. Chequei o andar no visor eletrônico que mostrava um “5” vermelho. Meu ponto chegou. Saí, um pouco envergonhada porque meu vizinho estava bem ao meu lado vendo o meu sofrimento. Mas ele me deu passagem enquanto eu, com as mãos trêmulas, saía do elevador, tentando pescar as chaves no meu bolso da calça. O meu vizinho parecia ser ágil por abrira a porta e já se encontrava fechando-a. E eu ainda estava atrapalhada com o tanto de chaves que havia em meu molho em busca da única que abriria a porta.
Me senti ainda mais inútil.
Eu só queria entrar e conseguir uma dose de álcool e espaço para me esgoelar de tanto chorar.
Eu sabia que deveria ter ligado para a Marie, a melhor amiga de todos os tempos, ela me faria rir, mas do que adiantava me divertir num curto momento se quando eu desligasse a tristeza voltaria a me assombrar.
Porque o amor pra mim era isso. Um loop infinito de começos e fins, sem interrupções. Principalmente porque eu não gosto de ficar sozinha. Sou carente, romântica e carinhosa. Qualquer pequeno sinal de falta de afeto é preocupante para mim, por isso eu havia terminado com o Peter, ou ele havia terminado... Isso não importava, quem havia feito o que. O que importava era que eu me sentia uma bosta e não estava nem um pouco afim de ficar dando explicações “mas por que vocês terminaram?” odiava, odiava essa pergunta. Simplesmente porque ela trazia para a minha cabeça tudo o que eu sentia e estava tentando evitar.
Me joguei na poltrona e olhei pras fotos do porta-retratos. Ali dentro estava quatro fotos que eu tirei com o Peter quando fomos no parque de diversões em Nova Jersey. Meu estômago embrulhou e uma sensação de náusea invadiu todo meu corpo.
Eu não queria lembrar o passado, mas também não queria imaginar o futuro porque não sabia o que estava por vir e tentar me prever só me deixava pior. Levante-me, mas o fiz só para dar um chute forte no porta-retratos e vê-lo espatifar, quebrando o vidro e todo seu material ao tocar com violência o chão.
Eu queria fazer churrasquinho daquelas fotos.
Mas antes, eu precisava de um bom álcool para fazer as chamas pegarem. Fui até a cozinha e peguei uma garrafa de uísque, virando todo seu conteúdo em minha garganta, não deixando nada passar. Senti aquele líquido queimar de uma forma dolorosa a minha garganta, misturada com lágrimas a mistura se tornava um drink dos infernos.
Naquele momento considerei me matar. Pegar a faca e golpear meu estômago imitando a morte de Nancy Spungen, mas eu sabia que nenhuma boa história terminava com mortes. As que colocavam morte em seu meio tinham apenas uma intenção: marketing. Somos uma sociedade hipócrita, apesar de nossas caras de choque, adoramos ver o circo pegar fogo. A Roma antiga está de prova. “Vamos ver o dilaceramento de alguém em público no Coliseu?” “Claro!”.
Então eu não iria me matar.
O apartamento da frente, o que abrigava um músico no qual eu não me lembrava de ter visto o rosto, começou a tocar.
Eu reconheci os primeiros acordes e junto com eles virei a garrafa. O filho da puta estava tocando Beatles. Ele estava tocando Something. E eu quis morrer de novo, mas dessa vez ia além do suicido. Eu estava mais inclinada para uma situação de querer simplesmente desaparecer. Pluft. E Daniela Jones nunca mais existiria.
Imagine só quantos corações não teriam sido desmantelados pela minha poderosa foice de sentimentos? Uma vez um ex-namorado meu me descreveu como uma pessoa difícil de lidar, como alguém que ia além das expectativas. Eu era uma tempestade. Eu sou como trovoadas. Escandalosa, fazendo muito barulho e assustando as pessoas boa parte do tempo.
Quis ir a forra, conversar com o vizinho e como havia bebido muito, rapidamente e sem nada no estômago eu estava brava e alterada. Capaz de arranjar briga facilmente, mas antes que eu pudesse fazer alo, as lágrimas voltaram. E apesar de meu músico vizinho já estar tocando outra coisa, uma música que eu não conhecia, o choro voltou. E ainda com a garrafa em minhas mãos comecei a virar mais e mais goles violentos ingerindo o máximo que podia, machucando meu próprio corpo como um castigo por ser estúpida. Fui pro quarto deixei a garrafa na mesa de cabeceira. Me joguei no colchão enrolando meu corpo em posição fetal.
Sem perceber, dormi.
Meu estágio era no final da tarde. Minha faculdade era de manhã, e no meio tempo eu ia tentar agir minha vida. Naquele dia eu cheguei dois horários atrasada na faculdade. Perdi o ônibus para o Brooklyn e cheguei atrasada no estágio.
- Dani? O que houve com você? – Senhora Martinéz, era uma imigrante mexicana, no nosso escritório havia várias imagens de Nossa Senhora Consuelo, eu achava muito bonito, mas de certa forma aquela não era a minha cultura.
Ela era bem nova, apesar de se vestir como uma velha.
- Nada. – Eu estava rouca, havia agredido minha garganta no dia anterior.
- Tem certeza, “chica”? – Era a forma carinhosa que ela tinha de me chamar, da forma que chamavam as meninas no país onde ela nasceu.
- É só ressaca. – Eu sabia que não era “só” aquilo, mas naquela altura do campeonato tudo já estava piorado. O stress daquele dia, o azar iminente. Parecia até que eu tinha ganhado tudo em Vegas. Não é isso que dizem “sorte no jogo, azar no amor?”, não me lembro de ter jogado nada, mas eu tava tendo azar em tudo que fosse possível.
Meus cabelos estavam oleosos e bagunçados, minha roupa estava com sujeira de ketchup por causa de um lanche comido com pressa, meus olhos estavam emoldurados por uma sombra escura de olheiras. Eu estava claramente um caco.
- E o Peter? – Apesar do sotaque dela a dor de ouvir aquele nome não foi menor. Parecia até ter sido maior. Dei de ombros e olhei para baixo indicando que eu não queria falar sobre o assunto.
Ela parou e voltou a usar o computador.
Nós duas trabalhávamos no escritório de planejamento da cidade, apesar de tudo, o prédio era feio e ficava no Brooklyn. Claro que havia outro escritório, melhor que o nosso, no Empire State, mas como nós ficávamos com o trabalho sujo, não tínhamos cacife pra trabalhar em um dos maiores edifícios do mundo.
Peguei um café na maquininha. E tentei me concentrar no projeto de um prédio perto do Rio Hudson “lá tem espaço pra mais um?” não conseguia parar de pensar naquilo, mas foi uma forma que meu cérebro encontrou de me distrair das milhares de coisas que ainda assombravam minha cabeça.
E eu ainda tinha mais seis horas de trabalho para aguentar.
Meu turno ia das quatro da tarde até as dez da noite. Voltava pra casa tarde, só chegava dez e meia caso o táxi não demorasse a parar, assim eu poderia dormir.
Mas naquele dia já cedo, eu já dava sinais de cansaço iminente.






3 comentários:

  1. Raphaela L. Siqueira18/10/2014, 00:54

    Nem preciso dizer que estou louca para conhecer a Dani mais profundamente e que amo essa fic, né???
    Ansiosa pros capítulos que virão.
    Beijos Bells <3

    ResponderExcluir
  2. Isa Pinheiro18/10/2014, 00:56

    Preciso dizer: Minha protagonista favorita. Bêbada,mais bêbada ainda em depre, cair em beatles sobre fossa e roupa suja de comida, ela descreve assustadoramente meu eu de um tempo atrás (não que eu deixei de ser bêbada ou de ouvir beatles, só sai da fossa mesmo).
    Já tinha lido 505 fervorosamente quando eu achei o blog, tanto que nem lembro se eu ainda era fantasma, e MEU DEUS, se eu já amava a fic antes, imagina meu estado agora com mais detalhes e essas cenas novas <3 <3 Sem contar aquele gostinho de ficar ansiosa e na expectativa de quando vai sair um cap. novo...

    BELLA E DANI: U GOT ALL MY LOVE <3

    ResponderExcluir
  3. Nem tenho que dizer já sinto uma paixão borbulhando no meu coraçãozinho de manteiga <3

    ResponderExcluir

Não precisa estar logado em lugar nenhum para comentar, basta selecionar a opção "NOME/URL" e postar somente com seu nome!


Se você leu o capitulo e gostou, comente para que as autoras atualizem a fic ainda mais rápido! Nos sentimos extremamente impulsionadas a escrever quando recebemos um comentário pertinente. Críticas construtivas, sugestões e elogios são sempre bem vindos! :)