standing next to me :: innocence & arrogance entwined



Estava escuro e frio, como qualquer outra noite de dezembro. Meu carro velho, estacionado na garagem da pequena estrutura que lembrava um chalé, qual eu gentilmente chamava de lar, estava coberto por uma fina camada de neve. Pelo menos torci para que ela suavizasse seu aspecto sujo e crônico que tinha desde que eu o comprei de uma senhora muito idosa.
  Coloquei a chave na ignição, torcendo para que aquela lata-velha pegasse, pois o relógio parecia estar fazendo de tudo para que eu me atrasasse para a pequena amostra daquela noite, uma apresentação que fora programada no último minuto possível.
  Fechei os olhos e girei a chave, o som do motor fez com que eu soltasse um suspiro de alívio.
  Você nunca me desaponta lata-velha, pensei enquanto dava um gentil tapinha em seu painel.
  Dei a ré com cautela, tomando cuidado para não passar pelo gramado da vizinha que já havia reclamado pela milésima vez de marcas de pneu na lateral de seu jardim. Honestamente, não fora com tanta cautela assim, pois meus nervos estavam aflitos e tudo o que eu queria era chegar a tempo no London Music Center.
  Naquela noite eu acabara me tornando uma ameaça à segurança pública, pelas minhas contas havia passado ao menos três sinais vermelhos. Com sorte não havia muito trânsito, as pessoas estavam em suas casas tomando chá em frente à lareira, o que era exatamente o que eu deveria estar fazendo naquela noite de sábado. Mas por um motivo eu não estava. Talvez dali a algum tempo, eu pudesse rir e dizer que fora o destino.
  - Eu queria saber quem é o responsável por essa maldita apresentação – resmungava enquanto estacionava em frente ao centro de música.
  Queria agradecê-lo pessoalmente com um beliscão na orelha.
  Eu nem queria estar ali. Havia aceitado o convite, apenas porque meu professor e maestro, Emmet White, insistira. Disse-me que eu iria ganhar uma “visibilidade ainda maior”. Que eu iria ganhar visibilidade tinha certeza, só não sabia se seria das pessoas certas. Na verdade, nem sabia quem eram as pessoas, muito menos sobre o que se tratava exatamente tudo aquilo.
   Adentrei o centro correndo com a caixa do violino batendo contra minhas costas. Quando atravessei as portas duplas que davam para a sala de apresentações, deparei-me com todo o grupo já no palco e posicionados em seus lugares. Na primeira fileira, havia dois homens até então desconhecidos e o Sr. White, que com seu suéter marrom e cabelos grisalhos se levantara imediatamente ao ver-me chegar. Ele correu até mim, apenas para me puxar pelo braço até o palco, como se eu fosse sua neta desobediente.
  - Claire, você está atrasada! Atrasada! – dizia com sua voz rouca.
  - E a culpa é minha que me avisaram com 20 minutos de antecedência? Eu moro longe, Sr. White!
  Ele apenas murmurou alguma coisa, indicou minha posição e tomou seu lugar como maestro.
  - Você não faz ideia de quem são, faz? – sussurrou Rachel, minha amiga que tocava comigo desde que comecei na companhia – Vou lhe dar uma dica, são um dos maiores músicos do rock atual.
  Seus cabelos ruivos estavam presos, destacando as sardas claras de seu rosto. Sentada ao meu lado, o sorriso que abriu ao apontar para a primeira fileira, era como o de alguém que contava piadas internas para forasteiros.
  - Bem, eles definitivamente não são os Beatles. Quantas alternativas me restam?
  Antes que pudesse me responder, Sr. White pediu silêncio. Ele adotara a postura séria, como sempre fazia. Era seu sinal de que a sinfonia estava prestes a começar.

  Estava guardando meu instrumento após o término da apresentação que levou cerca de quinze minutos, quando do backstage ouvi Emmet no palco procurando por mim. Coloquei o violino nas costas novamente, indo até ele.
  Meu professor não estava sozinho. Os dois homens presentes e sem dúvidas alguma, a razão de tudo aquilo, conversavam com ele. Ambos aparentavam ser de uma elegância indescritível, as costas eretas, os gestos sutis, eram alguns dos complementos que constituíam suas imagens. Uma primeira impressão favorável, um cartão de visitas indiscutível.
  - Claire, por favor, venha até aqui – pediu o Sr. White educadamente.
  Aproximei-me deles sem receio, sempre confiante do que estava fazendo, caso contrário poderia deixar o nervosismo que costumava ser um problema, tomar conta de mim.
  - Esta é Claire Watson, cavalheiros. Nossa mais talentosa violinista.
  O mais alto deles pegou minha mão delicadamente e ali encostou seus lábios.
  - Miles Kane. Encantado, senhorita – disse ele.
  Mordi minha bochecha e contraí a boca, pois tive a impressão que uma risada se formava dentro de minha garganta. Não de deboche, mas surpresa por estar diante de um dos poucos homens vivos na terra que ainda possuíam tais maneiras.
  - Eu posso dizer o mesmo – falei sorrindo-lhe.
  Já o outro, que combinava o jeans preto com um blazer e cujo cabelo estava perfeitamente alinhado com gel, dirigiu-me um aperto de mão, o qual retribui.
  - Alex Turner – senti a firmeza de seu pulso – Surpreso.
  - Como todos que me veem tocar.
  Ele não pareceu achar graça de meu comentário, então fitou nossas mãos antes de interromper o contato.
  - Eu creio que você pode se gabar, não é? – Miles riu – Qualquer um que já tocou em um show do Sir Paul McCartney pode se gabar.
  - Eu toquei só por uma música como substituta. E eu não quis parecer arrogante, foi só uma brincadeira.
  - De qualquer modo, você é boa no que faz – contestou – E é por alguém como você que estávamos procurando.
  A partir daquele momento seguiu-se um monólogo com uma série de explicações. Aparentemente, a banda paralela de Alex Turner e Miles Kane, também conhecida como The Last Shadow Puppets, nome que sinceramente achei quase um tanto peculiar demais, estava prestes a voltar à ativa após alguns anos. Eles planejavam uma série de apresentações com material antigo e inédito, antes de anunciar o novo álbum. Basicamente, estavam a procura de músicos para tocarem com eles, tanto ao vivo quanto em estúdio.
  - Você não precisa responder á nada agora, nós ainda vamos lhe colocar a parte de tudo – falou por fim.
  Cruzei meus braços enquanto drenava todas aquelas informações. Era um compromisso e tanto, que tomaria todo o meu tempo, obrigando-me a deixar meus tão esperados planos de lado. Entretanto, ao mesmo tempo era uma oportunidade de ouro, que abriria muitas portas para minha carreira. Eram os dois lados da moeda, mas nesse caso infelizmente eu não poderia decidir no cara ou coroa.
  - Eu vou pensar sobre isso – tentei parecer empolgada, para que não achassem que eu estava desprezando sua proposta – Há muitas coisas acontecendo na minha vida agora, mas eu vou com certeza pensar sobre isso.
  - Ótimo! É só o que queremos que você pense sobre o assunto.
  Concordei com um aceno e depois de um silêncio constrangedor e da promessa de Miles que manteria contato, despedi-me dele, de seu amigo mal-humorado e de Emmet.
  Não iria mais pensar sobre propostas e decisões difíceis naquele dia. Tudo o que eu mais desejava naquele momento era o aconchego de minha casa.

Alex POV

Quando alcancei a fachada do Music Center, um Ford antigo arrancou rumo á avenida. Miles me alcançou logo em seguida, acedendo aquele cigarro com cheiro ruim que sempre me nauseava.
  - O que você achou dela? – perguntou dando uma tragada.
  - De quem?
  - Claire Watson, é claro. Sabe Alex, eu a achei perfeita. Ela é mais talentosa que qualquer um que vimos, sem contar que ela é muito, muito bonita.
  - E tem um nariz muito, muito empinado – complementei – Não sei, ainda prefiro a ruiva.
  - Você só pode estar de brincadeira. A ruiva porra nenhuma! – soltou uma risada – Claire tocou com Paul fucking McCartney.
  - Como substituta por uma música.
  Kane jogou o cigarro no chão e pisou sobre ele antes de me encarar. Abriu-se um sorriso malicioso e eu já soube o que se passava em sua cabeça.
  - Você quer traçar a ruiva, não é mesmo? Tudo bem, eu entendo. Mas você não precisa disso para conseguir o que quer, cara. Claire vai tocar e você fica com a ruiva de um jeito ou de outro.
  Ri de seu comentário enquanto procurava a chave de meu carro no bolso do blazer. Por trás de todo o cavalheirismo de Kane, suas necessidades primitivas sempre gritavam mais alto.
  - Vá se ferrar, Miles. Garotas que tocam música clássica devem ser tão entediantes como freiras de convento.
  - Já que é assim que o senhor pensa, não posso fazer nada. Caso eu descubra o contrário, eu lhe aviso.
   Eu já sabia que ele descobriria. Mais que isso, tinha uma leve suspeita de quem o ajudaria nessa descoberta.

Um comentário:

  1. ai meu heart! <3
    dinâmica turner/kane era o que eu precisava.
    continua por favor!

    ResponderExcluir

Não precisa estar logado em lugar nenhum para comentar, basta selecionar a opção "NOME/URL" e postar somente com seu nome!


Se você leu o capitulo e gostou, comente para que as autoras atualizem a fic ainda mais rápido! Nos sentimos extremamente impulsionadas a escrever quando recebemos um comentário pertinente. Críticas construtivas, sugestões e elogios são sempre bem vindos! :)