She's thunderstorms: Capítulo 1- Neblina

Era só mais um cigarro naquela manhã, o quarto, talvez. Eu já não contava. Também era só mais um dia dentre tantos outros naquele mês, naquele último ano. Então mais uma gota ia ao chão. A primeira? Décima? Centésima? Já eram muitas lágrimas, incontáveis. E o dia se passou assim; lento, por números que eu já não podia contar, dia dentro daquelas altas e quentes paredes, dias de conforto, de dúvida, de água.
Ri sem graça pra janela, depois a beijei, era gelada. Acho que o tempo lá fora era assim, frio. Já fazia algum tempo que não punha os pés nem ao pátio, quem dirá as ruas. Levantei então do sofá, apenas pra dançar ao som de uma música calma que tocava no rádio da sala; ri mais uma vez, beijei o vento. Maleável, vazio, sonífero vento. O cheiro era de fumo e incenso, mas era a minha casa, meu cheiro, minha marca; já estava acostumada. Ao fim da música, o que me restou fazer foi recolher minha alegria e andar vagarosamente em direção ao banheiro; o sol se punha lá fora e meus olhos pediam para apreciar tal show.
Subir o balancim do banheiro e sentar no parapeito do mesmo era meu ingresso pra apreciar o espetáculo laranja, às vezes rosa, às vezes vermelho, mas sempre morno. Meu meio sorriso então voltava, assim como o cigarro na boca e a felicidade momentânea. E meus pés balançavam, dependurados, enquanto eu observava tudo como a primeira vez. Havia dias em que era preferível observar tudo debaixo da água quente do chuveiro, cantando alguma música aleatória; mas dias como aquele, dias após ele, eram sempre assim. Recheados de leveza, aconchego e repouso. Recheados de chuva.
E quando a noite caiu, já sem garoa, voltei para dentro; no próprio banheiro me arrumei. A estampa floral do vestido me caía bem, mas não tão bem quanto o vermelho do batom. Beijei o espelho, senti o gosto amargo. Espelho que mentia, que escondia, que nada de bom me dizia. Foram-se alguns segundos encarando a mim mesma de uma forma confusa, até o cheiroso líquido azul estar em mim, dar meia volta e sair com tudo remendado e arrumado as pressas até o bar mais próximo.
Encontrei ruas movimentadas, e aquele fluxo constante de palavras e sons me incomodou, meu apartamento tinha mesmo uma boa acústica. Com passos lentos e o olhar distraído me levei até a esquina, fiz sinal a um táxi e entrei. Absorta por um tempo, já estava em meu destino, o cheiro me lembrava de casa, mas havia algo a mais. Havia suor, havia corpos, havia animação, havia felicidade, havia tudo o que me faltava.

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