Now then, Mardy Bum 11: We're grateful and so strangely comforted


O caminho de volta para casa é silencioso. Com exceção das vezes em que Alex perguntou se eu queria ligar o ar condicionado, e me mandou tirar os pés do painel e do barulho do motor não há nenhum som. Não me importo. Fecho os olhos e encosto o rosto no cinto de segurança fazendo uma espécie de travesseiro improvisado. A lanchonete que estávamos não é exatamente perto de casa, então observo as luzes dos postes e os letreiros neóns que vão passando.
— Olivia? — Alex cutuca minha coxa, porque acabei caindo no sono. Pisco algumas vezes e coço os olhos, notando que chegamos na frente do meu prédio. — Você estava roncando.
— O que?!
— E babou um pouco.
— Sério? — pergunto sentindo minhas bochechas ficarem vermelhas.
— Não, mas a sua expressão fez minha noite. — ele ri e tamborila os dedos no volante.
— Oh, isso fez sua noite? E o que aconteceu na lanchonete agora há pouco?
Alex ri de novo. — Foi legal, também.
— Mas não foi o suficiente? — estreito os olhos e cruzo os braços no peito.
Ele coloca a mão na minha coxa. — Nem passou perto.
Tiro a mão dele e o cinto de segurança. Pela janela fechada do quarto de Pablo, posso ver que ele não está em casa. Provavelmente com algum cara e como isso é recorrente, não me dou o trabalho de me preocupar com ele ou meu cérebro vai se encarregar das imagens.
— Onde estão Matt, Nick e Cookie?
— No quarto do hotel — ele passa as mãos pelos cabelos, parecendo impaciente. — Dando uma festa de despedida ou algo parecido. Muita bebida e várias garotas.
Me preparo para sair do carro. — Oh. Ok. Divirta-se lá.
— Não quero ir, não to afim —diz. Nós nos olhamos e ele parece estar lutando com algo, hesitante em falar mais alguma coisa — Alguma chance de deixar eu passar a noite aí?
— Não vou dormir com você, Turner. — nem olho em sua direção quando digo.
— Por que? Já fez uma fez, pode fazer de novo. — soa um pouco descrente.
— Eu nunca dormi com você! — ralho, mas em elevar a voz.
— Tecnicamente — inclina a cabeça e estreita os olhos — isso não é verdade.
— Quer dizer dormir-dormir? Deitar-e-fechar-os-olhos-dormir?
Alex rola os olhos e me encara como se eu fosse uma criança, a voz transborda impaciência e sarcasmo — Há algum outro modo de dormir?
Depois de alguns segundos de hesitação e olhares impacientes de Alex, concordo que ele pode dormir no sofá. Ele diz que tudo bem, desde que tenha companhia, com um olhar malicioso, e eu digo que sim, ele até pode fazer um ménage a trois com o Travesseiro e o Lencol. O saguão do meu prédio é porcamente iluminado e o porteiro - sobrinho da dona Fátima - extremamente religioso me censura com os olhos por estar acompanhada de um homem, mas logo anuncia que o elevador velho e quebrado está finalmente consertado.Depois de dois meses e meio, já não era sem tempo, quase digo, mas acaba saindo um “yay!” fingido.
A porta do elevador abre com um barulho pesado, diferente do bip usual, mas não verbalizo minhas preocupações para Alex porque são quatro da manhã e realmente não quero pegar as escadas. Aperto meu andar e nós dois encaramos o teto e então, três segundos depois, o elevador para com um solavanco que quase me faz tropeçar e nós estamos parados no meio do segundo e terceiro andar.
Ai, caralho.
— O que foi isso? — pergunto começando a entrar em pânico.
Aperto o botão do térreo freneticamente e em seguida faço o mesmo com o meu andar. Não tem nenhum telefone daqueles que a gente pode falar com o porteiro, mas aceno até meus braços cansarem para a câmera do canto. Quando nada acontece, começo a hiperventilar.
— A gente tá preso, a gente tá preso, a gente tá preso. — repito sem parar.
Alex segura minhas mãos e tenta me acalmar — Eu sei, mas você deve ter o numero da portaria, aqui, pega meu celular e liga pra lá avisando.
— Oh, Deus, nós vamos morrer aqui em cima e a dona Fátima vai ter um treco quando vir meu corpo porque ela sempre disse que eu parecia muito com a filha dela e o Pablo não vai conseguir lidar ele não sabe lidar com esse tipo de coisa e aí ele vai ficar sozinho e não vai ter como pagar o apartamento sozinho e aí vai ficar sem casa e vai ser tudo culpa minha e além de estar morta vou ter que me preocupar com ser culpada por meu amigo virar um mendigo...
— Olivia — a voz dele está um pouco longe, tudo que consigo ouvir é o barulho que o elevador fez quando empacamos e como não consigo pensar em mais nada.
— E aí tem meu pai que vai dizer que ele estava certo desde o inicio e que eu não sei como viver sozinha que sou uma bagunça
— Olivia — ele chama mais uma vez com urgência, segurando meus dois braços com delicadeza, mas continuo balbuciando palavras atrás de palavras sem fazer pausa e sem conseguir raciocinar direito.
— e que minha mãe não devia ter me deixado vir pra San Diego e minha mãe vai se sentir culpada mesmo que na verdade ela só estivesse sendo uma ótima mãe oh Deus não posso morrer minha mãe oh meu Deus
Antes que eu possa ter reação, a boca de Alex toca a minha e seus lábios preenchem e fazem pressão nos meus. Não é um beijo quente, não há língua, ele só encosta os lábios deles nos meus por alguns segundos, ainda segurando meus braços e então consigo respirar devagar. Sinto minha musculatura relaxar e meus pensamentos desanuviarem. E quando começo a apreciar o contato, ele se separa e me olha preocupado.
— Você não calava a boca e eu não sabia o que fazer.
Respiro lentamente pela boca, soltando todo o ar. — Obrigada.
Estende o celular em minha direção e eu ligo para a portaria. O porteiro diz que imaginou que algo houvesse acontecido quando não conseguiu trazer o elevador de volta, mas que está tudo bem, ele vai chamar o cara pra arrumar assim que o sol nascer. Tenho um ataque de histeria e grito com ele por alguns minutos para que ele ligue para o cara consertar AGORA, mas diz que não há nada que ele possa fazer até o amanhecer e desliga. Ótimo, desliga na cara da garota tendo um ataque de pânico.
— Está se sentindo melhor?
Respiro mais uma vez. Incrível como respirar não parece uma resposta involuntária, agora.
— Um pouco. Ei, desculpa pelas coisas que eu disse, todas as coisas que eu falei sobre morrer e minha mãe e Pablo e etc.
— Você me assustou pra caralho. — diz arregalando os olhos um pouco.
— Eu sei.
— Eu nem estava pensando em morrer aqui e você começou a verborragia e não fazia pausa no fim de nenhuma sentença. Você parecia uma lunática falando e falando e...
— Alex! — grito zangada — Eu disse que sei.
— Nós só temos que enganar nossos cérebros, fazendo ele pensar que estamos aqui por escolha. Li sobre isso em algum lugar e parece que dá certo. —Faço uma careta. Me lança um olhar impaciente — Tem alguma ideia melhor?
— Não. — respondo olhando pro chão.
— Então fica quietinha e faz o que eu digo. Senta. — permaneço imóvel no meu lugar e ele xinga num vocabulário muito inglês, repetindo com mais convicção: — Senta.
— Não precisa ficar repetindo zangado, não sou um cachorro.
— Você seria uma péssima cadela. — ele diz e estou surpresa que não fez nenhuma piada cretina, mas agraciada pelo momento sem conotação sexual, não digo em voz alta.
— Eu nem seria uma cadela, pra começo de conversa. Seria uma gata. Cachorros são incríveis, não me entenda mal, mas eles são muito pouco seletivos, não acha? — começo a amarrar os cadarços da minha botinha preta, distraída. — Gatos não, eles não amam instantaneamente, não latem por atenção ou quando estão zangados; o máximo que fazem é eriçar o pelo, o que significa que você deve ficar longe. Tem também a maneira como eles se mexem, elegantes, despreocupados, mas precisos. E é bem legal como eles, apesar de auto-suficientes, escolhem continuar com os donos. Meio como “olha, eu não preciso de você, mas me mostra que vale a pena, porque eu quero precisar”.
Termino de amarrar meus sapatos e olho em sua direção e Alex está me encarando com aquele misto de interesse e confusão, como se eu fosse uma grande equação difícil que não consegue resolver. Mas mesmo que nos seus olhos eu possa ler linhas e mais linhas sobre o que realmente quer dizer, no final, tudo o que sai de sua boca é:
— É uma analogia interessante.
— Eu sou uma garota interessante. — brinco empurrando meu ombro com o dele. — Você deve ser, também, um pouquinho. Me conta alguma coisa, qualquer coisa.
Ok, essa é interessante. Fiz essa pergunta para todos os caras com quem saí (e tudo bem, tudo bem, eu sei não foram muitos e nem o suficiente para contar como pesquisa de campo) e toda vez que as palavras saiam da minha boca, eu era uma bola de ansiedade. Porque eu sempre tive essa teoria que dá pra conhecer um cara por essa resposta; ele só precisa responder e você vai saber se ele é o cara que você pensou ou só... um cara. Meu ex namorado balbuciou coisas como “sei lá” e alguns caras foram um pouco menos monossilábicos, entoando um “estou com fome” que me fazia encolher por dentro.
— No Reino Unido, você vai do primário para o secundário até os onze anos — explica com um olhar nostálgico — E quando nós saímos do primário, todas as crianças formariam grupos e realizariam uma performance, as garotas iam dançar Spice Girls ou algo assim. Então eu e Matt e alguns amigos, fizemos “Morning Glory”. Nós tocamos algumas raquetes de tênis e fingimos sermos Oasis. Matt era Liam Gallagher, ele tinha aquele chapéu de balde. Eu era o baixista. Nós só ficamos parados lá, fazendo o que Oasis fazia no palco. — faz uma pausa. — O que não era nada demais. Não acho que tivemos uma reação do publico tão boa quanto as Spice Girls.
— Eu teria me apaixonado por você, bem ali. — digo fazendo cachinhos ao redor do meu dedo, como uma garotinha.
— Por que?
— Oasis foi a minha obcessão adolescente! Eu colava pôsteres e recortava fotos de revistas e achava que banda nenhuma, no mundo, se comparava ao potencial deles. — dou um fraco sorriso me lembrando dos meus 12 até 16 anos — Eles foram ao Brasil algumas vezes, mas nunca conseguir ir ao show. Agora eles se separaram e não tive dinheiro para a turnê de despedida. E tudo bem para mim não ter visto Beatles... Eu morreria feliz se visse Oasis.
— Então nós teríamos sido namorados de primário?
Finjo pensar um pouco, olhando pro teto e estreitando os olhos.
— Provavelmente, mas eu te trocaria pelo jogador de futebol ou qualquer outra coisa que vocês jogam lá na Inglaterra.
— E o que sentiria agora, sabendo que dispensou o vocalista da banda mais foda dos últimos tempos? — pergunta mexendo no anel que usa no dedo mindinho.
— A banda mais foda dos últimos tempos, é? Ficaria orgulhosa, acho. — olho pra ele de canto de olho — E provavelmente tentaria dar pra você no banheiro sujo do camarim, depois de algum show.
Ele arregala os olhos. — Sério?!
— Não, mas sua expressão fez minha noite. — sorrio repetindo a provocação.
Alex ri também e brinca com a barra lateral do meu vestido. Diz que não sabia que eu agia como uma bêbada quando estava com sono e eu olho no relógio do visor do celular, marcando cinco horas e quarenta minutos, e mando ele se acostumar. Ainda temos bastante tempo.
— O que será que os elevadores tem? Não dá pra ter uma conversa neles sem que a gente se sinta constrangido. O que é engraçado e eu nunca vou entender é porque tem casais com fetiches por eles. Qual é a graça de fazer sexo num cubículo em movimento?
— Não sei, mas parece algo muito... íntimo, não acha? Como se assim que as portas se fechassem, estivessem só vocês dois. E ninguém poderia ver o que acontece lá dentro. — seus olhos me encaram e uma sobrancelha se arqueia sugestiva.
— Com exceção do cara da segurança. —aponto com a cabeça para a câmera no canto.
— Talvez isso torne tudo mais excitante. A possibilidade de serem pegos. — da de ombros. — E além disso, não há nada que ele poderia fazer além de assistir. E não é isso que todos nós queremos, na vida? Sermos assistidos? — sua voz é um pouco pesarosa, encarando a parede lisa atrás de mim. Percebo que esse é uma daquelas frases carregadas de significado e historias que ele nunca vai me contar.
— É... Talvez seja isso. Deve ser pela descarga de adrenalina, como naquele jogo onde só tem uma bala numa arma e mesmo que haja a possibilidade de serem pegos, as pessoas escolhem apostar na sorte. — são quase seis horas da manhã e eu devia calar a boca.
Ele engasga uma risada e me encara, descrente.
— Acabou de comparar sexo à um jogo de Roleta Russa?!
Eu rio também, tirando a franja da testa.
— Tem razão. Estou passando tempo demais com você, Turner, e ficando idiota por osmose.
— Não o suficiente. — comenta em voz baixa, mas ainda alto o suficiente para eu ouvir. Depois ele abre um maço novo, tira o isqueiro prateado e acende o cigarro sem pressa.
— Estamos presos em dois metros quadrados, não vai fumar agora, vai? — pergunto com desaprovação. Ele encara de volta pelo canto do olho, soltando a fumaça e estendendo-o na minha frente numa oferenda silenciosa. O desafio está dentro de suas orbes e só para não ceder e me render, aceito. — Claro, porque não?
Trago com dificuldade e expiro tudo pela boca, sentindo muito pouco da fumaça. Ele me instrui a esperar alguns segundos dentro e respirar pelo nariz e assim que o faço, começo a tossir freneticamente, o que o faz gargalhar um pouco.
— É sempre ruim na primeira vez.
Aí é a minha vez de rir, porque o fumar e a frase que ele acaba de dizer me lembra minha adolescência e mesmo que trágico, não há nada a se fazer senão rir.
— Qual a graça? — pergunta olhando para mim e suas botas.
— É o que o meu ex namorado costumava dizer.
— Oh... — ele começa, entendendo o que eu quis dizer e mesmo que seja vergonhoso pra caralho, sinto vontade de continuar. Sinto vontade de contar para ele sobre isso e cinquenta e quatro coisas a mais da minha infância e adolescência, por que gostaria de ouvir sobre as dele e porque estamos presos num lugar minúsculo e ele está certo. É intimo.
— Faria sentido se ele tivesse dito que é sempre ruim na primeira vez e nas cinco outras.
Ele concorda com a cabeça um pouco chocado. — E porque terminou com o Sultão do Sexo?
Franzo o cenho e lanço um olhar obvio para ele. — Não acabou de ouvir sobre as seis vezes péssimas? Em seguida eu vim para San Diego e a gente não manteve contato.
— Então não houve nenhuma vez depois dessa? Você simplesmente desistiu?
Dou de ombros. — Cansei de sentir que o problema era comigo.
— É claro que não era! — dessa vez é ele quem me lança um olhar óbvio e o sotaque fica mais evidente. Estou começando a me acostumar com os dialetos ingleses, mas vez por outra a entonação britânica ainda me faz vibrar por dentro num grande sorriso.
Dou de ombros mais uma vez. — Talvez fosse.
— Se um cara tem seis chances de dar prazer para uma garota e não consegue, acredite: a culpa é, definitivamente, dele. — ele encara o cigarro por alguns longos segundos, provavelmente hesitando na pergunta seguir e no momento em que as palavras saiam da sua boca, desejo que continuem lá. De repente, não sinto mais tanta vontade de compartilhar. — Então você nunca... Nunca teve um orgasmo?
Empurro o ombro dele com força e enterro meu rosto entre os joelhos, fazendo minha voz sair mais alta, como num grito abafado — Cala a boca, a gente não precisa falar sobre isso!
Ele gargalha mais uma vez e concorda com a cabeça. — Claro, claro, porque temos muito o que fazer até a ajuda chegar. O que vai acontecer, provavelmente, daqui a duas horas e meia, contando com o tempo do cara acordar e se deslocar até aqui.
— Vamos falar sobre outra coisa, então. Sobre sua ex – ou atual ainda, dá pra ter certeza? - namorada, a apresentadora bonitinha.
— A gente não precisa falar sobre isso — comenta me imitando e dando outra tragada.
Longos minutos se passam, mas o silencio não é nem um pouco constrangedor. Me ponho a observar as paredes lisas e metálicas sem nenhum atrativo. Depois conto os andares e fico surpresa ao notar que tem mais do que pensei que tivessem. Leio o aviso sobre quantas pessoas cabem, o limite de peso e depois passo a multiplicar o numero que está do lado do outro. Não me movo e não escuto barulho nenhum, além do sutil queimar do cigarro e sopradas.

Um comentário:

  1. Eu nunca dormi com você! — ralho, mas em elevar a voz.
    — Tecnicamente — inclina a cabeça e estreita os olhos — isso não é verdade.
    — Quer dizer dormir-dormir? Deitar-e-fechar-os-olhos-dormir?
    Essa é Olivia se entregando ao fato de BEM QUE ELA QUERIA! haha
    Adoro esses dialogos deles, são engraçados e de tanta conotação sexual, até quando nao tem eu ja acho que tem lol

    ResponderExcluir

Não precisa estar logado em lugar nenhum para comentar, basta selecionar a opção "NOME/URL" e postar somente com seu nome!


Se você leu o capitulo e gostou, comente para que as autoras atualizem a fic ainda mais rápido! Nos sentimos extremamente impulsionadas a escrever quando recebemos um comentário pertinente. Críticas construtivas, sugestões e elogios são sempre bem vindos! :)