Now then, Mardy Bum O2: Do Me A Favour And Stop Flattering Yourself


Meu pai é americano e minha mãe brasileira, então desde que consigo me lembrar, estamos indo e vindo do Brasil para os Estados Unidos. Mais especificamente, de Minas para San Diego, onde a família do meu pai mora. Atualmente, os dois estão em Minas, próximos a empresa que meu pai fundou e minha mãe administra. Devido a essa proximidade com San Diego e os cuidados superprotetores da minha família, no Brasil, decidi que esse era o melhor era mudar para cá e começar a viver a minha vida. Não preciso dizer que eles, principalmente o meu pai, ficaram putos e a quantia de dinheiro que mandam é meramente representativa.
Agora eu moro num apartamento pequeno demais com um mexicano aspirante a Antonio Bandeiras chamado Pablo e meu gato, Snoopy.
Pablo é o típico estereótipo do cara da cidade pequena querendo subir na vida tentando ser ator: ele é bonito, tem um corpo bacana e sex appeal. E é gay. Tão, tão dolorosamente gay! Enquanto procurava por um apartamento no centro, o anuncio falando sobre um cara de 23 anos que procurava uma mulher para dividir o aluguel me chamou instantaneamente atenção. Mas só precisei que ele abrisse a porta e um sorriso para perceber o quão irônico a vida pode ser. Porque se eu gostava de homem, Pablo era um entusiasta.
Foi por isso que procurou especificamente uma garota com quem dividir o apartamento; disse que não confiava em si mesmo no mesmo aposento de um cara bonito. Disse – e eu estou usando as exatas palavras:- que ficava indomável. O bom humor e a animação me conquistaram, enquanto minhas bolsas e maquiagens o conquistaram. Temos uma relação legal.
O prédio onde moro fica a dois quarteirões do hotel onde o Hard Rock fica, o que facilita meu percurso quando acordo mais tarde do que deveria. Mas em noites como essa, quando fico depois do expediente normal, Jesse me deixa ficar num dos quartos de funcionário que o hotel disponibiliza. Não me atrevo a reclamar ou insistir para ir para casa, porque mesmo com menos de 300 metros separando o quarto dos funcionários para o meu, Jesse diz que é perigoso.
Olho para o relógio e mando uma mensagem de texto pro celular de Pablo, só para que não fique preocupado. Sendo sexta-feira, ele provavelmente trouxe algum cara para casa, mas eu tento não imaginar esse tipo de coisa rolando no quarto ao lado do meu.
Também não fujo do estereotipo de garota-super-protegida-acaba-se-tornando-garota-má. Quando meu pai não deixava que eu fosse para festas com o pessoal da ensino médio, por medo que eu começasse a beber ou a fumar, eu bebia e fumava dentro de casa. Roubava pequenas quantias; um copo de whiskey, um cigarro que seria aceso dentro do banheiro – e eu odiava -; por birra. Talvez se ele não tivesse proibido, numa tentativa inútil de me manter distante da malícia do mundo, eu não tivesse me interessado.
A frase clichê “tudo que é proibido, é mais gostoso” só era valida quando quem proibia, era meu pai.
***
Posso ver a claridade através de minhas pálpebras, mas continuo deitada tentando voltar a dormir. Não consigo me lembrar em que dia da semana estamos ou até em que cama eu estou, mas não me importo. Giro para o lado contrario à parede tentando achar uma posição confortável e tento dormir. Passo vários minutos nessa tentativa frustrada, até que bocejo abrindo os olhos lentamente e ouço a voz familiar me dar bom dia.
— Rise and shine, Tinky Winky.
Jesse me conhece bem o suficiente para saber que sou uma entusiasta de desenhos animados, especialmente os da década de 90. E apesar de Telletubies não entrar nem para minha lista dos Vinte Melhores, ele diz que esse nome parece comigo. Não sei se devo encarar como um elogio: Tinky Winky era gordo, roxo e gay, mas parece ter mais haver com a bolsa vermelha que ele sempre carregava. Gosto de bolsas vermelhas.
— Bom dia... Que horas são?
— Pouco mais de nove horas...
— Porra. Porra, porra, porra, porra... — murmuro repetidas vezes, me levantando apressada. Caminho em direção ao chuveiro com uma mochila que deixo embaixo da cama, para situações como essas — acha que ainda consigo chegar a tempo do café da manhã?
— Não sei, talvez. Fecha as 10:00, então se conseguir tomar banho e se vestir rápido, tarefa que parece humanamente impossível para vocês, mulheres, sim. Você tem até as 9:45.
— Porra, porra, porra... — repito enquanto ligo o chuveiro.
Sempre que durmo aqui, tomo café da manhã no saguão do hotel, como qualquer outro hospede. A diferença é que uma pequena taxa é descontada do meu salário, mas ainda é mais econômico do que ir à padaria, que fica a pelo menos 5 quarteirões de distancia do apartamento. Vale ressaltar que não sou muito atlética – conto com os bons genes das brasileiras, porém. Obrigada, mãe. -, então qualquer atividade física potencialmente cansativa é recusada.
Visto um short e uma blusa de alcinha, folgada, tentando parecer de férias. Não dá certo. Apesar de ter dormido mais do que deveria, parece que nunca estou devidamente descansada.
O saguão do hotel é arejado, banhado e aquecido pela luz forte do sol. As janelas de vidro e as mesas bem organizadas me faz lembrar minha casa, no Brasil. Quando moramos sozinha, a única luz forte que faz parte da nossa vida é a do compuador.
Entro na fila para pegar ovos mexidos e panquecas e estou quase lá quando noto a pessoa atrás de mim. Alex está de bermuda e camisa preta, parecendo cansado e satisfeito, ao mesmo tempo. Ele parecia ter essa aura, essa mistura de sensações conflitantes dentro dele, o tempo todo. Os cabelos ainda um pouco molhados e um cheiro de sabonete quase me fazem sorrir.
— Gostei da calça.
Olho por reflexo para minhas pernas.
— Não estou usando calça.
— Eu sei. É por isso que eu gosto delas. — responde com um sorriso de moleque.
— Não tem nada melhor para fazer do que perseguir garotas em hotéis? — olho para frente, tentando evitar contato visual.
— Não seja convencida. — ele sinaliza com a cabeça a bancada à frente. — Estou aqui pelo bacon.
A fila anda e eu dou vários passos, tentando sufocar essas ideias. Presumir que ele está aqui por minha causa é absurdo e me envergonho. Felizmente, Alex não parece ter ligado, e continua insistindo numa conversa:
— Pensei que trabalhasse aqui, não que estivesse hospedada.
— Porque? Não pareço com qualquer outra garota desse saguão? — não consigo evitar me irritar.
— Não parece com qualquer outra garota.
Não consigo evitar amolecer por dentro.
— Eu trabalho aqui. Mas tive que passar a noite, por causa de alguns garotos querendo cerveja depois que já fechamos... — brinco, sorrindo pela primeira vez no dia.
— Que absurdo! — Alex diz com falsa indignação.
Nós dois tentamos não sorrir, apesar de termos sorrisos completamente diferentes. Turner sorri cauteloso, discreto, como se não quisesse me dar o privilégio de tê-lo feito sorrir. O meu é tímido, mais para mim. O chef pergunta que tipo de ovos vou querer e quando respondo, Alex pergunta:
— Da onde vem isso? O sotaque, quero dizer.
— Eu tenho sotaque? — pergunto debilmente. Ele me lança um olhar meio óbvio. — Brasil.
E assim, pela simples menção desse nome que faz os turistas lembrarem de modelos da Victorias Secrets, o sorriso carregado de malícia está lá, de novo.
— Brasileira... — repete contemplativo — Hot.
— Literalmente.
Ele deve ter conhecimento da temperatura do Brasil, porque não pergunta. Lembro das tardes excessivamente quentes e dos “invernos” de 17 graus que tínhamos em Minas.
Caminho até uma mesa quando ele segura meu cotovelo com a mão esquerda e me guia até uma mesa pouco ensolarada, no canto do saguão. Outros três homens estão sentados lá, parecendo trinta vezes mais cansados que o Turner. Dois estão de cabeça baixa, aparentemente dormindo e o terceiro está batucando na mesa com os talheres.
Apesar de dispersos, todos levantam os olhos quando chegamos e não consigo evitar corar; não sei lidar com tanta atenção. Alex não pergunta se quero sentar lá ou tampouco puxa a cadeira para eu sentar, mas indica com a cabeça que eu sente na cadeira a frente da dele, ao lado do garoto batucador. Alex começa a comer, não percebendo que temos estão com grandes interrogações na testa e leva meio minuto para perceber que ninguém falou nada, desde que sentamos.
— Oh. Essa é a Olivia.
Os outros dois integrantes murmuram coisas como “e aí” e abaixam a cabeça. O garoto batucador estende a mão e se apresenta, percebendo que o Turner não pretende fazer isso.
— Oi. Eu sou Matt. — nós apertamos as mãos e ele me lança um sorriso encorajador. — Esse é o Jamie e Nick — aponta para os garotos, que dizem “e aí” e voltam a abaixar a cabeça — e você conhece o Turner.
— Eu não diria que conheço, mas é... Conheço o Turner. — respondo encarando-o, que levanta o rosto por poucos segundos e finge um sorriso.
— É claro que conhece. — ele parece ofendido.
— Não. Sei que é vocalista dos Arctic Monkeys e que gosta de pertubar a paz de garotas em saguões de hotel, mas é basicamente isso. — “ o que mais tem para conhecer” ele pergunta de boca cheia. — E você não sabe nada sobre mim.
— É claro que sei. — insiste enumerando fatos sobre mim. — Você trabalha no Hard Rock. É brasileira. Péssima no Guitar Hero. Tem calças legais. Não consegue tirar os olhos de mim.
Rio alto, porque pela maneira séria como ele diz, não sei dizer se é uma piada. Pela forma egocêntrica que ele tem demonstrado durante os últimos minutos, porém, não posso dizer que me surpreenderia se não estivesse brincando.
— O quêêê? Não consigo tirar os olhos de você? Bem que você queria. E eu sou ótima no Guitar Hero!
— Não, não é. Fiquei bem ofendido de você não tocar Brianstorm no expert. É tão fácil! Consigo tocar de olhos fechados.
— Urghh. — resmungo. — Você é tão irritantemente convencido.
— Thats my charm. — responde sorrindo debochado.
Enquanto conversávamos, não percebi que Matt nos encarava com visível interesse. Corei, me concentrando no prato a minha frente. Ele sorri e olha no relógio, me despertando da manhã louca que tive. Não posso ficar aqui tomando café com uma das bandas mais talentosas da atualidade; preciso ir para casa, preciso me preparar para o trabalho de mais tarde. Vou precisar chegar antes das 19:00, porque vai ter um show de talentos no Hard Rock e o local provavelmente vai encher de adolescentes que querem ser o próximo Alex Turner.
A naturalidade da conversa me desconcerta. Não parece que estou conversando com os Arctic Monkeys e sim caras normais que beberam demais, noite passada. Alex continua focado no prato a sua frente e assim que termina, leva as mãos ao bolso, voltando com cigarros e um isqueiro.
— Preciso ir. — me levanto apressada.
— Foi bom conhecer você. — Matt diz com um sorriso educado. Retribuo sem dizer nada, me afastando devagar da mesa.
— E Olivia... — Alex diz, sem virar para trás, o sotaque mais carregado que de costume e mesmo estando de costas, quase posso ver o sorriso pretensioso — Eu realmente gostei das suas calças.

3 comentários:

  1. Alex minhas pernas também são legais, quer tocar!? (6' haha #parei
    Enfim, adoro esses diálogos deles, é tão...envolvente! Haha

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  2. Essa fic é muito bem escrita! Estão de parabéns

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